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Harris ou Trump? Investidores votam na estabilidade

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Kamala Harris ou Donald Trump, um dos dois será o próximo presidente dos Estados Unidos. As últimas sondagens divulgadas antes das eleições, agendadas para terça-feira, mostram que está tudo em aberto. Os mercados estão a antecipar um governo dividido, com republicanos e democratas a partilharem o poder na Casa Branca, Senado e Câmara dos Representantes. Um cenário que agrada aos investidores, uma vez que vai limitar a aprovação de propostas mais polémicas.

“Depois de uma campanha eleitoral extraordinária, as tensões estão muito elevadas antes da votação nos EUA em novembro – e as implicações para os mercados podem ser bastante diferentes dependendo de quem ganha”, escreve Greg Meier, diretor e economista-sénior da Allianz Global Investors, numa nota na qual antecipa potenciais impactos das eleições dos EUA nos mercados.

Para o especialista, há três áreas que serão afetadas pelos resultados eleitorais desta semana: crescimento económico, inflação e procura por ativos seguros.

“Dada a nossa suposição subjacente de um governo dividido, pensamos que uma segunda presidência de Trump poderia significar ações internacionais e dos EUA mais fracas, mas um apoio ao dólar e ao ouro dos EUA, com implicações menos claras para os títulos do Tesouro dos EUA”, antecipa o responsável da gestora de ativos alemã.

Dada a nossa suposição subjacente de um governo dividido, pensamos que uma segunda presidência de Trump poderia significar ações internacionais e dos EUA mais fracas (…) Com a probabilidade de Harris continuar pelo menos algumas das políticas do Presidente Joe Biden, o impacto no mercado, caso ganhe, poderá ser mais neutro, com um possível apoio às ações.

Greg Meier

Diretor e economista sénior da Allianz GI

Já num cenário em que a democrata Harris seja a vencedora, Meier diz que há a probabilidade da candidata continuar algumas das políticas de Joe Biden, pelo que o impacto no mercado “poderá ser mais neutro, com um possível apoio às ações e matérias-primas dos EUA.”

“Independentemente de quem ganhe, acreditamos que a política fiscal poderá ter um impacto surpreendentemente limitado, já que as propostas fiscais e de despesas mais agressivas dos candidatos não conseguem tornar-se lei sem o apoio do Congresso”, acrescenta o analista, que reconhece que, caso as sondagens falhem, e o Governo tenha maioria no Senado e na Câmara dos Representantes o impacto no mercado seja bem diferente.

Meier realça que “os mercados não gostam de incerteza” e em períodos pré-eleitorais a volatilidade tende a aumentar. Mas, “uma vez conhecidos os resultados, os mercados provavelmente voltam a focar-se no crescimento económico e nas taxas de juro“. “Isto significa que para a maioria dos investidores o importante é analisar qualquer volatilidade e permanecer investido.”

George Brown, economista sénior da Schroders, concorda que, “num governo dividido, com republicanos e democratas a terem qualquer combinação de controlo partilhado sobre a Casa Branca, o Senado e a Câmara dos Representantes, o destino dos cortes fiscais de 2017 provavelmente será misto, com algumas disposições a expirar, enquanto outras poderão ser prorrogadas ou restringidas.”

Este é (mais um) dos pontos de desacordo entre Trump e Harris. O antigo presidente norte-americano defende um prolongamento destes cortes fiscais além de 2025, mas a democrata tem criticado o programa implementado em 2017 por favorecer os ricos e as grandes corporações.

“Uma coisa que torna o resultado das eleições extremamente crucial é que os eleitores dos EUA estão mais divididos do que nunca em tópicos-chave que vão desde a imigração, políticas fiscais, política externa e, em geral, valores sociais”, aponta Peter Garnry, Chief Investment Strategist do Saxo.

Para o mesmo especialista, “os riscos geopolíticos para os EUA e os seus aliados e rivais são particularmente elevados, uma vez que Harris e Trump têm convicções e atitudes muito diferentes.”

Outro aspeto que poderá ser influenciado pelo resultado das eleições é a política monetária da Reserva Federal dos EUA, que desceu taxas pela primeira vez no passado mês de setembro. Enquanto Trump poderá tentar interferir nas decisões do banco central, reduzindo a independência da autoridade monetária, uma Administração democrata deverá deixar o chair Jerome Powell tomar as decisões sobre taxas de juro sem interferências.

Trump vs Harris. Quem ganha e quem perde

Um dos maiores riscos para os mercados, num cenário de uma vitória republicana com controlo do Congresso, é o maior protecionismo. Uma má notícia para as exportadoras e empresas de fora dos EUA, mas que pode beneficiar companhias mais expostas ao país.

Tarifas mais elevadas sobre as importações e impostos mais baixos seriam, em teoria, bons para as pequenas capitalizações dos EUA e, em geral, para as empresas cuja maior parte das suas receitas provém da economia dos EUA“, prevê o Saxo. Entre as empresas europeias nem todas perdem. O setor da defesa poderá ganhar com a eleição de Trump, “porque a Europa seria forçada a acelerar os planos de gastos na sua própria indústria de defesa caso os EUA reduzissem o seu compromisso na Ucrânia e continuassem a minar a confiança na força da NATO”, explica Garnry.

Já os bancos poderão ser animados pelas políticas fiscais de Trump e pelos seus projetos para avançar com a desregulamentação.

Num cenário de vitória democrata, mas sem o controlo do Senado e da Câmara dos Representantes, “a reação imediata poderá, na verdade, ser positiva, uma vez que o mercado ficará aliviado pelo facto de as políticas populistas inflacionistas não poderem ser implementadas em nenhum dos cenários.”

Uma vitória de Donald Trump poderá favorecer petrolíferas do país e a banca, assim como empresas norte-americanas mais expostas ao país. Harris deverá beneficiar as empresas de energias renováveis, infraestruturas e ter um efeito positivo no mercado como um todo.

Se Harris ganhar com uma vitória limpa (controlo total do Congresso), “O impacto óbvio no mercado é uma recuperação nas ações de energia limpa” e um impacto positivo nas construtoras devido ao foco na habitação. “Os semicondutores também deverão reagir de forma mais positiva a uma medida de Harris, uma vez que limita o impacto de tarifas mais elevadas”, antecipa o analista do Saxo.

Os analistas do IG concordam que uma vitória democrata será mais favorável às empresas de energias limpas, enquanto Trump vai beneficiar as petrolíferas americanas, na medida em que pretende dar prioridade a um aumento da produção de petróleo e gás no país.

Para o setor tecnológico, o IG estima que com “o impacto pode ser misto. Potenciais guerras comerciais, especialmente com a China, podem prejudicar empresas com cadeias de abastecimento globais como a Apple e a Nvidia”. Já a “desregulamentação e a redução dos impostos corporativos poderiam beneficiar gigantes da tecnologia com mercados domésticos fortes”.

Com Harris, a vontade demonstrada pela candidata para regular a inteligência artificial pode criar alguma incerteza no curto prazo para empresas como a gigante Nvidia.

Ações ignoram ciclos eleitorais

Apesar do calendário eleitoral ter sempre impacto na negociação e causar alguma instabilidade nos mercados, a história mostra que o comportamento das ações norte-americanas tende a ignorar se o presidente é republicano ou democrata. Controlar Senado e Câmara dos Representantes, ou partilhar o poder também tem pouco impacto na evolução dos índices acionistas.

“A política pode suscitar fortes emoções e preconceitos, mas seria sensato que os investidores ignorassem o ruído e se concentrassem no longo prazo. Isto porque, embora os mercados possam ser voláteis em anos eleitorais, o partido político que ocupa a Casa Branca quase não fez diferença quando se trata de retornos de investimento a longo prazo“, escreve o Capital Group, numa análise ao impacto das eleições nas bolsas.

Segundo a gestora de ativos, “desde 1933, houve oito presidentes democratas e sete republicanos, e a direção geral do mercado foi sempre ascendente. Sair do mercado para evitar um determinado partido ou candidato no poder poderia ter prejudicado gravemente os retornos a longo prazo de um investidor.”

“Por definição, as eleições têm vencedores e perdedores claros. Mas os verdadeiros vencedores foram os investidores que evitaram a tentação de basear as suas decisões nos resultados eleitorais e permaneceram investidos a longo prazo“, remata o Capital Group.


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